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juliagiusti

Deus é mulher: Elza Soares

Este post estava aqui no forninho, porque a história dela é tão intensa que ainda não havia acabado de escrever, só que ontem Elza virou estrela, então vou finalizar, para que a gente nunca esqueça da história dela.





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Elza Soares é uma mulher MARAVILHOSA que escolhi para dar seu nome a um dos brincos que criei, porque apesar de quase tudo aqui na Tangerina ser pequeninho, é uma peça maior e que representa para mim (um pouquinho) da presença que Elza carrega.


Por isso, se você não sabe a bagagem que esta mulher tem, pega um café ou chá e senta aí, que eu vou te contar e a história é grande.


Elza nasceu no dia 23 de janeiro de 1930 na favela Moça Bonita (Vila Vintém) e ainda pequena se mudou para um cortiço no bairro de Água Santa. Com 12 ou 13 anos seu pai a obrigou a abandonar os estudos e a se casar com um amigo dele, porque ele havia tentado abusar dela (machismo que me embrulha o estômago). Ali ela sofreu MUITA violência doméstica e sexual e com 13 anos teve o primeiro filho (!!!!!!).


Perdeu seu primeiro filho para a fome, e aos quinze anos perdeu o segundo filho, também para a fome. Para piorar, nessa época seu marido teve tuberculose, então ela começou a trabalhar. Um ano depois, quando ele se recuperou, a proibiu de trabalhar fora novamente e ela voltou a ser dona de casa (!!!!!!!!!).


Com 18 anos oficializou o matrimônio, usando o sobrenome dele (Soares) e aos 21 ficou viúva pois seu marido teve novamente tuberculose e não resistiu.

Há uma fonte que diz que ela se separou dele quando este lhe deu dois tiros ao descobrir que ela trabalhava como cantora e que ela não o viu mais até ele morrer.


Em 1950 sua filha Dilma foi sequestrada com um ano de idade pelo casal que tomava conta dela enquanto Elza trabalhava. Ela só a reencontrou depois de 30 anos - e Dilma não sabia de nada. Com o tempo elas se aceitaram como mãe e filha, e como o crime prescreveu, o casal não foi preso.


GARRINCHA

Elza conheceu Garrincha em 1962 e iniciaram um romance enquanto ele era casado. Um ano

depois ele separou e quatro anos depois (1966) oficializaram a união.

O casamento de ambos foi motivo de revolta para os fãs e a imprensa, que acusaram Elza de ter acabado com o casamento do futebolista. Para fugirem do assédio da imprensa, foram para São Paulo. A perseguição chegou a tal ponto que Elza foi impedida pela multidão de realizar um show na Mangueira e teve de sair disfarçada para escapar do público.


Os ataques foram aumentando e a família de Elza passou a receber cartas e ligações telefônicas com xingamentos e ameaças. Na mesma época, Elza gravou o samba "Eu Sou a Outra", cuja letra enfureceu ainda mais a imprensa e a opinião pública; radialistas quebravam o disco com a canção no ar, uma medida comum na época para expressar descontentamento com uma nova música.


Com a morte da ex-esposa de Garrincha, suas seis filhas vão morar com ela, Garrincha e seus filhos. Em 1976 nasceu Manoel Francisco dos Santos Júnior, apelidado de Garrinchinha.


Em 1982, após dezesseis anos de matrimônio, o casamento de Elza e Garrincha chegou ao fim, por conta de constantes agressões físicas, ciúmes doentios, traições e humilhações, onde o alcoolismo dele tornou-se insuportável. Durante todos estes anos, Elza tentou ajudar o marido a parar de beber, mas ele e os amigos dele a chamavam de bruxa.



FILHOS

Elza teve oito filhos, todos de parto normal:

Seus dois primeiros meninos que não foram registrados, morreram com poucas semanas de vida devido a desnutrição,

João Carlos (que ela teve de entregar para adoção por falta de condições para criá-lo),

Gilson (morreu em 2015, aos 59 anos, vítima de complicações de uma infecção urinária),

Dilma (sequestrada com 1 ano de idade em 1950 e reencontrada somente em 1980),

Sara e

Manoel Francisco, apelidado de "Garrinchinha" (morreu em 1986, aos nove anos, em um acidente de carro).


Após a morte de Manoel a cantora ficou desesperada, se afundou nas drogas, entrou em depressão, tentou suicídio e passou a tomar antidepressivos, até decidir deixar o tratamento e viajar pelo mundo a trabalho focando exclusivamente na sua carreira. Morou em diversos países até ter condições psicológicas de retornar ao Brasil, quatro anos depois.



"A única coisa do passado que ainda me machuca é a perda dos meus quatro filhos. O resto tiro de letra. Mas filho é uma ferida aberta que não cicatriza. Estará sempre presente!"

MÚSICA

Cultivando o sonho de cantar desde a infância, já compunha nessa época suas primeiras canções. E, confiante em seu talento para cantar devido aos elogios que recebia de parentes e amigos, se inscreveu no concurso musical do programa radiofônico Calouros em Desfile, em meados de 1953, que era apresentado pelo compositor Ary Barroso.

Para a apresentação, usou um vestido da mãe, aproximadamente vinte quilos mais gorda, ajustado com vários alfinetes de fralda, fazendo um penteado de maria-chiquinha no cabelo.

Quando Elza subiu ao palco foi recebida pelo auditório e por Ary Barroso, com gargalhadas. Ary a tentou ridicularizar perguntando-lhe:



De que planeta você veio, minha filha? E Elza rebateu: Do mesmo planeta que o senhor, Seu Ary. Do planeta fome.



Um dia seu irmão Ino a desafiou a fazer um teste para a orquestra de seu professor e ela conquistou uma vaga no conjunto. Elza passou a acompanhar o grupo em apresentações em festas, bailes, casamentos e eventos sociais em geral. Nem sempre ela se apresentava, contudo, pois alguns clubes não admitiam uma cantora negra no palco.


Em 1960 conseguiu realizar seu sonho de trabalhar somente com a música, quando surgiu um concurso na rádio e como foi a vencedora assinou um contrato para cantar semanalmente. Com o tempo, acabou sendo convidada para aparecer na TV, e nesse mesmo ano fez sua primeira turnê internacional.


Por meio de Aldacir Louro, conseguiu sua primeira oportunidade de gravar um disco. Contudo, foi novamente barrada pelo racismo quando os executivos da gravadora se decepcionaram ao descobrirem que ela era negra. Aldacir não desistiu e, com a ajuda de Moreira da Silva, gravou um compacto com "Brotinho de Copacabana" e "Pra Que É Que Pobre Quer Dinheiro?" pelo selo independente Rony, que não fez muito sucesso.


Pouco depois, Aloysio de Oliveira, produtor da Odeon, a chamou para um teste, a partir do qual ela foi contratada para o seu primeiro registro de uma grande gravadora: "Se Acaso Você Chegasse", que teve grande visibilidade nas rádios.

Quando começou a cantar na Rádio Tupi, foi vítima de racismo mais uma vez quando alguém jogou uma lâmina de barbear dentro de seu vestido sem que ela percebesse, o que lhe causou um corte que a fez sangrar muito.


Tornou-se mundialmente conhecida por seu tom suavemente grave e levemente rouco da voz, o que a fez conquistar muitos prêmios ao longo da carreira. Suas músicas falam bastante sobre romance, preconceito racial e feminismo.


No início dos anos 1960, por conta da campanha negativa que a imprensa fazia contra ela como reação ao seu envolvimento com Garrincha, os convites para shows foram ficando cada vez mais raros.


Em 1968, Elza foi aos Estados Unidos e ao México, onde realizou vários shows bem-sucedidos. E também tentou emplacar um novo projeto na gravadora Odeon: um disco em parceria com Roberto Ribeiro. A gravadora relutou por ele ser desconhecido e por ele ser um cantor de escola de samba desacostumado ao estúdio, e quando aceitou gravá-lo, passou a recusar registrá-lo na capa. A desculpa era que ele era feio mas Elza suspeitava de discriminação racial, o que se confirmou quando, segundo ela, um diretor disse: "Não quero esse nego feio e sujo na capa!". Elza disse que ou o disco saía ou eles a perderiam, e o projeto foi concretizado, fazendo grande sucesso e rendendo a Roberto pelo menos mais um disco pela Odeon.



Em 2000, foi premiada como "Melhor Cantora do Milênio" pela BBC em Londres.

Em 2002, o álbum Do Cóccix até o Pescoço garantiu-lhe uma indicação ao Grammy.


Já atuou como puxadora de samba-enredo, tendo passagens pelo Salgueiro, Mocidade e Cubango.

A partir de 2008, a vida e obra da cantora começou a ser pesquisada pela cineasta e jornalista Elizabete Martins Campos, que roteirizou, dirigiu e produziu o longa-metragem My Name is Now, Elza Soares. Realizado pela IT Filmes, o filme já rodou 18 festivais, sendo destaque no “Festival do Rio - Rio Internacional Film Festival”, com quatro indicações.


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Dedico esse texto à minha amiga Nicole, que certa vez me contou que um familiar quando via Elza na TV dizia que ela se achava, e ela respondia: tem que se achar mesmo, com uma história dessas.


Foi aí que corri para conhecer Elza.

Obrigada amiga.



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Elza, vá em paz.

Espero que gostem muito,


Um beijo,

Julia G.

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